quarta-feira, 23 de fevereiro de 2011

>>> doação >>>

Reconstruindo
Cruz Vermelha recebe doações para a reconstrução da zona serrana do Rio. Precisa-se de voluntários que "busquem os problemas" onde eles estiverem.

Acompanhamos, no último dia 21, a entrega de um caminhão de donativos para a base avançada da Cruz Vermelha, em Guapimirim (RJ). Antes da chegada, o cenário da zona serrana do Rio já mostrava resquícios da maior tragédia climática do país, como vários trechos de montanhas marcados por deslizamentos e depósito de entulhos nas laterais das rodovias. A boa notícia é que bases como a de Belo Horizonte e dos municípios atingidos pelas chuvas estão lotadas de materiais.

“O Brasil botou pra quebrar”, disse José Cláudio Souza, coordenador da base de Guapimirim, ao mostrar a grande quantidade de alimentos e água recebida. A urgência agora é ter à disposição voluntários para dar atendimento constante às vítimas e “procurar os problemas”, como por exemplo os condutores de veículos de tração nas quatro rodas, que alcançam áreas inacessíveis para automóveis comuns e têm exercido papel essencial na ajuda às famílias isoladas.

José Cláudio é técnico em segurança do trabalho com especialização em construção civil e afirma, sem demonstrar qualquer dúvida, que as proporções da tragédia seriam reduzidas “de forma gigantesca” se houvesse planejamento e cuidados básicos na urbanização e ocupação do solo. “Há cidades em que qualquer construção, em qualquer local, é autorizada e reconhecida pelos poderes públicos”, ilustra. Para ele, o número real de mortos pode ultrapassar a marca de dez mil, já que, em muitos locais, dezenas de famílias inteiras foram soterradas e não há qualquer possibilidade de haver resgate.

Uma lição amarga, mas que pode ser entendida por autoridades, instituições, profissionais e cidadãos em geral. “Há muitas formas de ajudar nossa população além da doação de materiais”, reforça o voluntário da Cruz Vermelha, apontando para uma sociedade que planeje seu desenvolvimento e busque as soluções para os problemas.

Texto e imagens: Rogério Alvarenga

sexta-feira, 11 de fevereiro de 2011

Bebida mata mais que HIV e violência, diz OMS
Quase 10% das mortes de jovens estão relacionadas ao consumo de álcool

No dia da renúncia do ditador Mubarak, no Egito, uma outra notícia pode passar despercebida aqui no Brasil, embora divulgada nos principais meios de comunicação. A Organização Mundial da Saúde (OMS) divulgou relatório que aponta o alto poder de destruição de uma droga muito festejada no Brasil - o álcool. Segundo os estudos, quatro em cada 100 mortes no mundo estão ligados ao consumo de bebidas. Esse número é tão representativo que ultrapassa as mortes por Aids, por tuberculose e por violência, e é especialmente grave entre jovens de 15 a 29 anos, quando atinge quase 10%.

Os malefícios das bebidas alcoolicas não são novidade na ciência. A OMS reforça o que médicos e cidadãos curiosos já sabem há um bom tempo: bebida pode provocar cirrose, doenças cardiovasculares, vários tipos de câncer e problemas psiquiátricos. As embalagens de cigarro já trazem essas informações. As propagandas de cerveja ainda trazem jovens bonitos, saudáveis e alegres bebendo.
A OMS sugere a regulamentação do mercado de bebidas, de forma ampla, o que envolve redução da demanda e restrições ao consumo por jovens e por motoristas.

Na contramão do debate cada vez maior sobre regulamentação das drogas, a Associação Brasileira das Agências de Propaganda (Abap) critica o cerco fechado à publicidade da cerveja. Em 2008, lançou um manifesto contra a proibição da propaganda. Na campanha, a Abap faz a seguinte comparação: "Querem proibir a propaganda de cerveja no Brasil. É o mesmo que proibirem a fabricação de abridores de garrafas no Brasil".

O relatório completo pode ser consultado no site da OMS (clique aqui).

Texto: Rogério Alvarenga
Charge: http://mundodoarthur.wordpress.com

terça-feira, 1 de fevereiro de 2011

>>> cinema, aspirinas e urubus >>>

Inquietações políticas na tela
Mostra de Cinema de Tiradentes leva ao público temas como drogas, enchentes e secas

Repleta de pré-estreias e homenagens, a 14ª Mostra de Cinema de Tiradentes deixou como principal marca a discussão em torno de temas sociais, anunciada já na temática desta edição: "Inquietações políticas". Drogas, enchentes, secas, polícia, descaso dos governantes e desigualdade foram algumas questões levantadas por longas e curtas ao longo de nove dias de uma agradável overdose cinematográfica rodeada por montanhas e barroco.

Os perigos da bebida alcoolica são maiores do que os de muitas drogas ilícitas, como a maconha. É o que afirma o especialista britânico David Nutt, que coloca o álcool como a quinta droga mais perigosa, levando em conta danos físicos, sociais e dependência - a maconha não figura entre as dez. Essa é uma das questões levantadas pelo bem produzido "Cortina de fumaça", longa de Rodrigo Mac Niven. Surpreendente? Nem tanto, já que nos deparamos com a cirrose, os acidentes de trânsito, os vícios e as brigas proporcionadas pelo consumo exagerado, ainda que "social", da bebida. Mas, se isso não é novidade, por que o mercado do álcool é regulamentado e festejado, enquanto a maconha é proibida e antissocial?


Já as vítimas das enchentes e deslizamentos de terra, geralmente famílias de baixa renda, foram lembradas no documentário "Enchente", de Julio Pecly e Paulo Silva. Trata, especificamente, dos acontecimentos de 1996 no bairro Cidade de Deus, no Rio. Nem todas as imagens são de alta resolução, mas o fato de Julio ter vivenciado a tragédia, do tema estar em evidência após os acontecimentos na zona serrana, e do filme abordar o descaso das autoridades - e mesmo de alguns moradores - arrancaram aplausos do público. A cena mais aplaudida mostra uma sobrevivente lembrando que são os moradores da periferia que trabalham para dar conforto à classe média.


Enquanto uma parte da população sofre com a abundância de água, outra sofre com sua escassez. Mas o tema "seca" também pode reservar surpresas aos desavisados: no semi-árido nordestino, existe chuva suficiente para uma boa (sobre)vivência do cidadão. Esse é um dos aspectos abordados em "Sertão progresso", documentário de Cristian Cancino, que mostra ainda discursos de políticos favoráveis à transposição do Rio São Francisco, moradores (subestimados?) que acreditam no sucesso do empreendimento e o protesto através da greve de fome de um líder religioso.


Bem que as inquietações políticas poderiam ultrapassar as telas do Cine-Tenda ou Cine-Praça, armadas em Tiradentes, agradável cidade do interior de Minas: no evento com tema tão apropriado, não rodaram ônibus durante a madrugada. Segundo funcionários da empresa de transporte coletivo, a Prefeitura não autorizou. Inquietação elitizada?

Texto: Rogério Alvarenga
Foto: Analu Sousa